Um mistério que eu acreditava ser um dos maiores do universo acabou de cair por terra, e eu tô chocada: acho que finalmente entendi porque o serviço público não funciona no Brasil. Que ele não funciona, qualquer um que tenha olhos e ouvidos sabe, mas fora a síndrome de reclamação generalizada que é de praxe nos quatro cantos do país, ninguém até hoje tinha me explicado exatamente porque, e menos ainda, como isso acontece.
Pois eu descobri, e tô fula da vida, é mais do que inacreditável; é revoltante a um nível espetacular.
Estava eu inocentemente nas minhas horas de ócio durante essas férias e me deparei com um post na página do facebook do Café Brasil. Sigo essa página há algum tempo, para me atualizar nos podcasts, que ouço sempre que quero ter meus neurônios chacoalhados...
Me deparei com a imagem do sr. Herbert Parente, limpando a estátua de Machado de Assis, no Rio de Janeiro, depois que algum débil mental fez uma pichação; e a reação da população ao saber que mesmo após R$25 mil reais em gasto com manutenção apenas na estátua, foi necessário um humilde cidadão munido de seus próprios recursos pra resolver o problema.
E então, o milagre: a explicação de porque o serviço público, não importa em qual área esteja aplicado, não tem qualidade. Pra ficar mais didático, dividi em passos a coisa toda:
Passo 1 - Abrir um processo interno com pesquisas prévias de no mínimo 3 empresas completamente em dia com todos os órgãos do governo (INSS, FGTS, Receita, etc)
Passo 2 - O departamento jurídico verifica se o edital estava correto (se não volta para correção) e libera o edital para ser publicado no diário oficial do município, com prazo para entrega das propostas.
Passo 3 - Se alguém se sentisse injustiçado, pediria a suspensão do processo. Aí o departamento jurídico iria defender o município dizendo que estava tudo certo.
Passo 4 - Aguardar a publicação do vencedor no Diário Oficial. Publicado, seria redigido o contrato em três vias e enviado via correio para que o vencedor da licitação assinasse e enviasse de retorno.
Passo 5 - Tendo em vista o prazo decorrido, o vencedor pediria realinhamento de preços, pois o produto a ser utilizado aumentou de preço. O responsável pelo processo envia para o setor jurídico para ver se pode dar o realinhamento de preços. O setor jurídico encaminha para o departamento de compras para fazer uma nova pesquisa de mercado e ver se realmente o preço aumentou. Aí, tendo em vista os meses que se passaram desde a solicitação, realmente o preço aumentou. Aí o setor jurídico refaz o contrato e manda ser publicado no Diário Oficial e dá um novo prazo para a empresa ou pessoa executar o serviço.
Passo 6 - A empresa então executa o serviço, e o município arca com a despesa.
(A pergunta de um milhão de reais no caso é: "Um funcionário da prefeitura não poderia fazer a limpeza?" e no post já temos a resposta: "Não pode. Porque no quadro não tem funcionário especializado em limpeza. Se pedir para o Zé Mané, o sindicato entra com um processo por desvio de função. Aí o setor jurídico terá que defender a prefeitura,mas a justiça do trabalho dará ganho de causa ao funcionário que foi obrigado a fazer algo que não constava de suas obrigações. Este aproveita a deixa e entra com uma queixa-crime contra seu superior, que o mandou fazer o serviço, alegando assédio moral.")
Isso tudo somado, talvez uma espera de 6 a 8 meses. Levando em consideração que por incrível que pareça, esse é o melhor cenário, não tendo em conta pequenas coisas como corrupção, desvio de dinheiro público, incompetência, etc.
Tive essa dúvida muitas vezes, porque nos estágios hospitalares, a única coisa que eu via mais do que pacientes eram equipamentos parados, e sempre que eu fazia essa pergunta, ganhava bufadelas e olhares de desespero.
É tanta coisa errada que nem dá pra começar a descrever. E nem sequer imagino por onde é sequer possível começar a concertar. O que resta mesmo é só decepção e raiva. Uma raiva imensa de ver essa situação se repetindo, incontáveis vezes, em milhares de cidades do Brasil, enquanto estátuas ficam sujas e pacientes morrem.
Entender eu acho que entendi, mas bem que não queria. É como diz aquele ditado, "ignorância é uma benção".
Acho que pra essa pergunta, eu prefiro as bufadelas.
Sr. Herbert Parente, o herói
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